Um ombro é mais alto que outro. Minha cabeça pende para um dos lados. Minha coluna tem muitas curvas. Minha coluna não tem curvas. Quando a gente descobre alguma assimetria no corpo e passa a associá-la à dor que sente, estabelece uma relação fantasiosa que, na maioria das vezes, retroalimenta-se.
Diferenças entre os lados esquerdo e direito do corpo acontecem normalmente e podem não estar diretamente relacionadas à dor. Antes sim, a dor provoca mudanças na postura e no movimento que são facilmente observadas, estabelecendo uma ligação aparente entre a dor e a assimetria observada.
Com frequência, assimetrias pontuais surgem como solução para suplantar dificuldades habituais ou para aliviar a dor. Aqui, mais do que uma restrição, o desequilíbrio viabiliza o movimento e mantém sua função.
O problema aparece quando, ao associar indelevelmente dor e desequilíbrio postural, a dor persiste mesmo quando seu fator desencadeante já deixou de existir, restando a assimetria e a dor previamente associada a ela.
Quando se busca uma solução para problemas dessa natureza é preciso antes dissipar uma cortina de fumaça, pois a causa principal da dor não é tão evidente quanto aparenta ser. Nesse caso, a história de cada um, os hábitos e costumes, fatores de risco, enfim, a maneira como cada um se relaciona com o ambiente oferece pistas tão valiosas quanto uma avaliação clínica ou achado de imagem.
Como nem sempre é possível interferir na rotina a ponto de permitir que as mudanças necessárias para corrigir o problema aconteçam, é preciso que o pouco tempo dedicado à terapêutica seja especialmente elaborada para ‘inverter’ os malefícios da rotina, através de uma intervenção pontual. Isso, muito frequentemente, significa abrir mão de uma prática com a qual se tem grande afinidade em detrimento de outra, menos prazerosa talvez, embora mais eficiente.
A quebra do vínculo entre a dor e assimetria acontece de maneira independente: dor e assimetria devem ser encaminhadas de modo específico e separadamente, cada qual seguindo seu caminho. Buscar resolver um problema em função do outro significa aprofundar esta relação, sob o risco de acabar criando uma ligação que antes sequer existia.